Estudo analisa comportamento da erva-mate em diferentes condições de cultivo
PESQUISA
Plantas são cultivadas em área experimental da UFSC
A Embrapa tem se dedicado a uma série de estudos com o intuito de selecionar variedades de erva-mate mais adaptadas a diversas condições de cultivo. Recentemente, um projeto de pesquisa inovador conduzido por cientistas da Empresa selecionou quatro clones de erva-mate, dois masculinos e dois femininos, cultivados em dois sistemas distintos – monocultura e agroflorestal – em área experimental da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Curitibanos (SC).
O objetivo desse estudo pioneiro foi conferir se as taxas de fotossíntese seriam superiores nas plantas de erva-mate com flores femininas, em ambos os ambientes de cultivo, devido ao pressuposto de que elas investiriam uma quantidade maior de fotoassimilados (compostos resultantes da fotossíntese) na produção de biomassa, em comparação às plantas masculinas.
Os resultados revelaram notáveis diferenças na estrutura das plantas, particularmente em relação aos clones femininos, que apresentaram menor área foliar específica e entrenós mais longos do que seus semelhantes masculinos na condição de monocultura. Entrenós são intervalos entre os nós que, por sua vez, são locais onde estão posicionadas as folhas, por exemplo.
Os dados demonstraram que os clones femininos avaliados revelaram taxas fotossintéticas superiores apenas quando cultivados no sistema agroflorestal, onde puderam alocar mais nitrogênio nas folhas e uma quantidade substancialmente maior de água nos ramos e folhas em comparação ao sistema de monocultura.
Por outro lado, no cenário de monocultura, todos os quatro clones estudados exibiram taxas de fotossíntese significativamente mais elevadas, bem como maiores investimentos na produção de biomassa, em comparação com o sistema agroflorestal.
A pesquisadora Miroslava Rakocevic explicou que foram analisadas diversas variáveis, incluindo taxas fotossintéticas, a arquitetura das copas das plantas, a biomassa das folhas e dos ramos, além da alocação de carbono e nitrogênio em diferentes partes das plantas. Medidas morfológicas foram coletadas e usadas para modelar a arquitetura da parte aérea das plantas, enquanto os dados de fotossíntese e de irradiância foram empregados para modelar as taxas de fotossíntese da erva-mate ao longo do dia.
Um dos achados interessantes foi o fato de que os maiores tamanhos de entrenós nas plantas femininas podem ser uma adaptação para acomodar melhor o desenvolvimento dos frutos, ao passo que a menor área foliar específica pode ser uma estratégia de adaptação para lidar com as elevadas taxas de irradiância presentes na monocultura. No sistema agroflorestal, diferenças arquiteturais foram observadas entre todos os clones, independentemente do sexo da planta.
Rakocevic enfatizou que, de maneira geral, foram detectadas diferenças notáveis nos números de entrenós, folhas, área foliar específica e ângulo foliar entre todos os clones, mas não se observaram diferenças com base no sexo das plantas.
Além disso, a pesquisa revelou que a biomassa das folhas e dos ramos é significativamente maior na monocultura, sem distinção entre clones femininos e masculinos. Também foi observado que os ramos e folhas de erva-mate retêm uma quantidade substancialmente maior de água no sistema agroflorestal.
As folhas dos clones femininos exibiram menor relação carbono/nitrogênio em ambos os sistemas de cultivo. No entanto, no sistema agroflorestal, essa característica foi fundamental para explicar as maiores taxas de fotossíntese por área foliar observadas nas plantas femininas.
Tanto as curvas de resposta à luz quanto a modelagem diária da fotossíntese indicaram diferenças relacionadas aos clones, mas não com o sexo das plantas no contexto da monocultura.
De acordo com Eunice Reis, pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente, no sistema agroflorestal, os clones femininos apresentaram taxas de fotossíntese superiores em comparação com os clones masculinos.
Por outro lado, na monocultura, as plantas apresentaram uma taxa de fotossíntese líquida significativamente maior do que no sistema agroflorestal, devido à alta irradiância e às diferenças estruturais entre as plantas, sem que o sexo dos clones tivesse influência nesse cenário.”Nosso trabalho mostrou que, a menor proporção C/N observada nas folhas dos clones femininos foi um importante marcador fisiológico do dimorfismo sexual em erva-mate”, concluiu a pesquisadora.
Este estudo revela importantes informações sobre a adaptabilidade da erva-mate a diferentes condições de cultivo e destaca o papel crucial da pesquisa científica na compreensão das complexas interações entre as plantas e o ambiente.
A pesquisa pode contribuir para o desenvolvimento de práticas agrícolas mais eficientes e sustentáveis na produção de erva-mate, uma cultura com grande importância econômica e cultural em algumas regiões do Brasil.
Erva-mate
A Ilex paraguariensis Saint Hilaire (Aquifoliaceae), conhecida popularmente como erva-mate, tem sua área de ocorrência natural restrita a três países: Brasil, Paraguai e Argentina. No Brasil, está dispersa principalmente nos estados da Região Sul e em Mato Grosso do Sul (MS), São Paulo (SP) e Minas Gerais (MG).
A erva-mate é uma árvore nativa da América do Sul e a maior parte da erva extraída provém de ervais nativos ou adensados, explorados por pequenos produtores, que se reúnem em cooperativas para o processamento ou a comercializam com grandes indústrias produtoras de erva-mate do sul do país.
A expressão do dimorfismo sexual secundário em plantas ocorre não somente por caracteres reprodutivos, uma vez que as plantas femininas são as responsáveis pela produção de frutos e sementes, mas também por estratégias fisiológicas. Sendo assim, em muitas espécies dióicas, plantas femininas compensam os custos reprodutivos apresentando, por exemplo, maiores taxas de fotossíntese que plantas masculinas. Quando o controle fisiológico não é possível, outras estratégias podem ser usadas tais como: redução das taxas de fertilização, do crescimento, da produção de biomassa e da longevidade da planta.
Este trabalho é resultado do projeto Cultivares de erva-mate de alta produtividade e uniformidade para diferentes regiões produtoras, envolvendo Embrapa Florestas, Embrapa Meio Ambiente e UFSC. Pode ser acessado aqui.
Fonte: Embrapa Meio Ambiente
Foto: Eunice Reis